Dr. Carlos Eduardo Guimarães

Você acredita em macumba?

Dr. Carlos Eduardo Guimarães*

Como fiz durante dois anos, no final de cada mês me dirigia a Montes Claros, onde lecionava curso de pós-graduação na Unimontes. Lá ficava na casa de meu irmão, que sempre me recebia com o coração aberto e muitos tira-gostos. Foi uma época muito agradável que me fez gostar muito daquele povo nortista. Em uma de minhas ausências de Caeté, aconteceu algo muito estranho, poderia dizer… muito sinistro.. Só fiquei sabendo quando cheguei de viagem.
O acontecido foi assim: Marlene, recepcionista, fazendo vistoria pelos arredores do SPA, se depara em uma encruzilhada com um arranjo de pólvora enrolada em papéis queimados. Vendo aquilo ficou toda arrepiada e logo imaginou; estão fazendo macumba aqui no SPA. Mais que depressa, tratou de ligar para sua tia (expert no assunto) para uma avaliação mais minuciosa daquela situação.
Chegando até o local, Dona Elvira (sua tia) fechou os olhos deu uma rodada em cima da pólvora queimada e pronunciou: Isto é macumba minha filha! Vejo que foi feita para você! Vejo que foi uma mulher loura, de cabelo anelado que pretende ficar com seu marido e atrapalhar sua vida! Após o diagnóstico, Marlene reuniu todos os funcionários do SPA e alertou a todos o ocorrido, chamando a atenção para a maldição que assolara o SPA. No mesmo dia o jardineiro Francisco, mais que depressa arranjou umas mudas de ?comigo ninguém pode? e tratou de plantar em todo o SPA. Luiz, sem pestanejar, passou a usar ramos de arruda pendurados na orelha e não titubeou, distribuiu para quem quisesse usar a ?erva protetora?.
O dia foi tenso e muito carregado, chovia fino e relampeava. À tarde aparece um motoboy com um embrulho contendo empadinhas e pastéis feitos naquela hora, dizendo ser um presente da Sra. Cida Bicalho para todos os funcionários, em retribuição ao excelente resultado obtido com a hidroterapia ministrada pelo professor Marco Aurélio. O embrulho ficou intacto. Ninguém ousou comer os petiscos. Um olhava pro outro e comentava: Eu hein… comer estas empadinhas… deve ter sido feita com galinha preta! Eu também não vou comer não… sei lá se foi a loura da macumba quem fez.
Neste mesmo momento aparece Nilo com defumador aceso e uma vela cor rosa enrolada com uma fita branca. Todo mundo queria estar protegido da macumba. No dia seguinte, Pretinha, filha de Marlene avisa que sua mãe não irá trabalhar porque amanheceu com vômitos e tonteira, e que provavelmente ficaria internada na Santa Casa para tomar soro. Esta notícia apareceu como uma ?bomba?, fazendo a todos, crer que a macumba tinha funcionado. O clima era de insegurança e se falava em trazer o Laércio para benzer o local.
O final de semana parecia não acabar para os funcionários do SPA, quando lá pelas seis horas da noite, cheguei de Montes Claros como sempre trazendo na bagagem uma pinga ?da boa?, farinha e requeijão. Na chegada observei os olhares dos funcionários com expressão de assustados.
Perguntei o que estava acontecendo. Mais que depressa, Adelmo que acabara de pegar o plantão noturno desabafou: Sabe doutor, fizeram macumba pra Marlene e ela está neste momento indo para Belo Horizonte para fazer alguns exames, já que na Santa Casa os recursos se esgotaram. Mais que depressa, perguntei: Mas que estória é essa Adelmo? O porteiro mais que depressa me convidou a ir ao local do despacho feito pra Marlene.
Chegando lá, Adelmo aponta em direção à pólvora queimada e avisa: Num chega muito perto não doutor, pode ser perigoso. Neste momento, comecei a rir sem parar. Adelmo mais que depressa perguntou o motivo dos risos. Então expliquei: Adelmo, eu que queimei estas pólvoras rapaz! Foram as sobras dos fogos do Reveillon, que não quis guardar por receio de algum acidente. Eu queimei estes fogos na sexta feira, antes de ir para Montes Claros!
Graças a Deus, disse Adelmo olhando para o céu. De repente um alívio tomou conta de todos. Luiz arrancou a arruda da orelha e os defumadores e velas foram apagadas imediatamente. Na segunda feira, Marlene teve alta do hospital e o SPA voltou a funcionar sem medo e sem estresse. Esquentaram as empadinhas e deliciaram como nunca.
Este fato vem nos ensinar que o medo é o principal inimigo de quem quer alcançar algum objetivo. Qualquer mal olhado ou macumba deverá ser combatida com coragem, pois, o maior inimigo mora na maioria das vezes, dentro de nós.
Até a próxima.

*Carlos Eduardo Guimarães é Médico, com especialização em Acupuntura e Clínica Médica e pós-graduação (latu sensu) em Fitoterapia. Autor do livro "Nutrição Ayurvédica - Do Tradicional ao Contemporâneo". Colunista do jornal Acontece (Caeté-MG), de 1997 a 2017, quando o jornal deixou de cirular impresso.