Daniele Vilela Cardoso Leite*
A criança vive o momento presente, sem estar presa ao passado ou futuro. Nesse sentido fica livre, sobretudo de ansiedades e ressentimentos. O que passou, passou e o que virá nem é cogitado. Meditar para os orientais é conseguir estar inteiro no momento presente e para isso são utilizadas várias técnicas. É óbvio que para o adulto o que passou e o que virá possui relevância. Mas não é necessário que seja mais forte que o momento presente. O desequilíbrio é que se torna o problema. Sábias as crianças que sonham, criam e imaginam… o mundo dos adultos tem estado tão sério e cético! Falta a alegria da infância, despreocupada, entregue ao momento!
Os adultos tem estado com o humor instável ou sem ele. O humor é uma virtude de humildade. Ninguém acha graça dos tombos, gafes e constrangimentos de si e dos outros se não tiver humildade. E a criança se deleita com as graças vistas pela vida. Já o adulto corre tanto e são tão exageradas as ambições que nem consegue rir dos imprevistos e surpresas que surgem. “As crianças pequenas não tem medo de olhar. Elas vêem, observam, notam, examinam, inspecionam tudo, e muitas vezes parecem fixar o olhar atentamente. Este é um dos modos importantes que as crianças tem a seu dispor para aprender e conhecer o mundo. As crianças cegas fazem isso com os outros sentidos” (Oaklander, Violet – Descobrindo Crianças).
Os adultos de hoje frequentemente olham, mas não conseguem ver nos vários ângulos. Estão muito embebidos de si mesmos para perceberem ao redor. Os outros sentidos também ficam adormecidos nesse mundo moderno. Tato, olfato, audição, paladar. “Para as crianças, o mundo – e tudo que há nele – é uma coisa nova; algo que desperta a admiração. Nem todos os adultos vêem a coisa dessa forma. A maioria deles vivencia o mundo como uma coisa absolutamente normal” (Gaarder, Jostein – O Mundo de Sofia). Ouvi certa vez que “as maravilhas do mundo são-nos reveladas a medida que nos tornamos capazes de percebê-las”. As crianças se maravilham, observam, descobrem, sonham, imaginam. São intuitivas, não tem medo de seguir o que o coração diz. Permitem a intuição. São muito conectadas à fonte. Chegaram de outro plano não faz muito tempo e permitem as descobertas . Sejamos adolescentes, adultos, idosos, fomos obviamente crianças um dia. E essa criança nunca morre. Apenas adormece no inconsciente.
Muitos adultos sonham que surfam, nadam, jogam, brincam, correm, amam, porque suas vidas são tão sérias que sem essa forma de liberar a energia psíquica ficariam loucos. Eis uma das explicações para a famosa frase freudiana “os sonhos são realizações de desejos”. O sonho não no sentido simbólico, mas literal possui uma importância primordial para os seres humanos. Isso é científico e comprovado. Todo extremo é pernicioso. Tanto a fixação na infância (não querer crescer) quanto o esquecimento dela são dolorosos. Resgatá-la pode salvar vidas. A criança que existe dentro de você pode lhe sorrir nesse instante. Repare só….
*Daniele Vilela Cardoso Leite é Psicóloga, professora de Yôga e colunista do jornal Acontece (Caeté-MG) de 1999 a 2017, quando foi encerrada a circulação da edição impressa.