Daniele Vilela Cardoso Leite*
A adolescência é uma fase complexa em termos de transformações físicas e psíquicas. São muitos os cortes, as mudanças. Muda o corpo, aparecem pêlos, crescem os seios e os órgãos genitais, assim como o corpo de uma forma geral, a voz sofre alterações.
O mundo externo no sentido do físico apresenta de maneira visível o que o mundo interno no sentido do emocional e do psíquico também vivencia. Transformações intensas, novidades, diferenças.
Os índios, em sua inteligência ancestral, utilizavam rituais para as mais variadas situações, principalmente em se falando de passagens. Culturas que estão mais conectadas com a natureza utilizam os rituais, pois eles ajudam na elaboração psíquica das transformações. Há um tempo atrás existiam bailes de debutantes, que faziam esse papel de simbolicamente apresentar o jovem à sociedade, que o recebia como alguém que ingressava em uma nova etapa, com novos papéis. Esse era um ritual de passagem. É interessante alimentarmos e darmos valor aos rituais. Quando eles se tornam repetitivos, rotineiros e sem uma conexão com a essência do que está realmente acontecendo, os rituais se enfraquecem. Mas quando há consciência, eles são belíssimos e possuem funções importantes. Tudo depende do sentido e da intenção colocados no ritual. Na adolescência, a consciência do papel dos rituais ainda não é algo muito compreendido. Essa maturidade virá com o tempo.
Na fase da adolescência as mudanças são muitas e provocam na família alterações. A homeostase familiar, ou seja, o modo “rotineiro” e “seguro” como todos cumprem seus papéis fica à mercê da necessidade de adaptação a uma nova realidade. É como o fechamento de um ciclo para abertura de outro, e isso implica em desestabilizar para estabilizar novamente.
Na verdade essa é a realidade da família e é a dinâmica da vida. Passar por fases, por períodos de altos e baixos. Mudanças tiram todos do conforto e da calmaria. É nesse contexto que vão ocorrendo as evoluções e os crescimentos. A questão é que em momentos de transformação, até haver novamente um período tranqüilo, (lê-se de segurança) todos os indivíduos, e nesse caso específico o adolescente e seus familiares, principalmente os pais, podem passar por momentos difíceis, de dores emocionais, de medos e inseguranças, principalmente se forem pessoas muito rígidas, que possuam dificuldade em flexibilizar. É tudo imprevisível.
A vida é da ordem do imprevisível e na adolescência isso se torna ainda mais explícito. É o momento da descoberta afetiva, do primeiro amor, momento da escolha profissional, fase de muita vulnerabilidade do jovem, o que exige dos pais paciência e atenção, pois as influências sofridas por terceiros, muitas vezes pessoas que não pertencem ao vínculo familiar são grandes. No entanto é também um excelente momento de crescimento.
Se os pais se conscientizarem do que realmente é a fase da adolescência, torna-se mais fácil a condução da relação com o filho. Cabe ao adulto, mais experiente, provedor, que já passou pela adolescência e por outras fases, ter uma visão mais ampla da situação e saber que esse momento de insegurança que o jovem atravessa (e cada um vai reagir a essa insegurança de uma forma, uns com agressividade, outros timidez, etc.) vai passar, é característico da idade. O jovem começa nessa fase a formar suas próprias convicções. Já diria Judith Vriost em seu livro Perdas Necessárias, “Sou parte de tudo que conheci. Mas essas partes foram transformadas. Cada um de nós é o artista do próprio eu, criando uma colagem. Uma obra de arte nova e original, com fragmentos e recortes de identificações”.
Apesar de sermos autores de nossa obra de arte (vida) desde que nascemos, é na adolescência que o indivíduo começa a ser mais responsável pela sua ?colagem?. Portanto é preciso que o adolescente tenha espaço para ser ele mesmo. Mas um espaço delimitado, pois ainda não está pronto para ser totalmente solto. Esse meio termo, nem preso e nem solto demais é um desafio e uma necessidade. O papel dos pais do adolescente é profundamente importante. Com amor, afeto e limite, e a consciência de que as mudanças são inevitáveis, produtivas e naturais, e acima de tudo com a aceitação de que assim é a vida, os desafios tendem a ser superados. A vida tende a fluir, para seguir seus passos, ocorrendo assim a evolução, o crescimento. Pois como diz o Skank, “o caminho só existe quando você passa”….
*Daniele Vilela Cardoso Leite é Psicóloga, professora de Yôga e colunista do jornal Acontece (Caeté-MG) de 1999 a 2017, quando foi encerrada a circulação da edição impressa.