Daniele Vilela Cardoso Leite

Compulsão por trabalho

Daniele Vilela Cardoso Leite*

A compulsão é um descontrole emocional no qual ocorre canalização de energia direcionada insistentemente a um objeto, gerando repetição contínua de um comportamento. Ela pode se manifestar de várias formas.
Pelo canal da alimentação, das compras (consumismo exagerado), da limpeza, do trabalho, entre outros. Psicologicamente, a energia que deveria estar sendo distribuída entre vários aspectos da vida (trabalho, descanso, lazer, etc.) sofre um desequilíbrio.
A saúde emocional depende da distribuição harmoniosa da energia psíquica, do potencial de vida. Geralmente distribui-se entre a família, o estudo, o trabalho, o lazer, o esporte, as relações afetivas, a espiritualidade, entre tantas outras possibilidades de escolha e identificação. Quando ocorre uma centralização exagerada em apenas um desses âmbitos, gera-se desequilíbrio e surgem conflitos, problemas, patologias. Quando há uma compulsão, seja qual ela for, é sinal de desarmonia nesses campos. Falta em algum lugar, sobra em outro.
Hoje em dia, diante da realidade de um mercado de trabalho altamente competitivo, assim como uma cobrança social (que se internaliza nas pessoas) no sentido da luta pela manutenção de um nível de vida financeiro, social e cultural, e de desejos cada vez maiores de ascensão nesses quesitos, os indivíduos se doam a busca de cada vez maior aperfeiçoamento profissional. Isto não é negativo, muito pelo contrário, desde que seja dosado, equilibrado, dividido. Já diria a frase “in médio virtus” (a virtude está no meio).
Quem canaliza todo o potencial exclusivamente para o trabalho torna-se ergomaníaco. Workaholic é outra denominação para os viciados em trabalho que o senso comum trouxe da cultura americana. Work (trabalho) alcoholic ( alcoólatra). Vira-se um escravo do trabalho e da produção. E vive-se por outro lado uma fuga da realidade. A absorção pelo trabalho é tão grande que não sobra tempo nem disposição para mais nada.
“A Psicóloga Libânia Leonel chama a atenção para o fato de existirem workaholics de todos os tipos, inclusive crianças e donas de casa. São aquelas pessoas para as quais o trabalho é uma compulsão. Elas só pensam em cumprir tarefas, em se destacar e serem aceitas pela exibição de seu trabalho ? e frequentemente abandonam sua vida pessoal, sua individualidade, afastando-se da família, dos amigos, do lazer.
Workaholics têm a ilusão, geralmente inconsciente, de que as faltas da vida, das insatisfações, possam ser preenchidas pelo trabalho. Ele realmente preenche, e muito. É algo vital. Mas novamente salientando que de maneira dosada. Diante de um problema, ao invés das pessoas silenciarem para escutarem conselhos externos e vozes internas, elas tentam preencher os espaços com outras coisas. Trabalho por exemplo. Mal sabem que estão impedindo assim, a vinda das respostas que tanto almejam. Esta é a maior sabedoria dos orientais. No caso da compulsão é a mesma coisa. Em busca da liberdade o indivíduo se escraviza.
Os ergomaníacos precisam refletir sobre essas questões, para que possam percebê-las e mudá-las. E se sozinhos não conseguirem, devem procurar ajuda especializada. Em pessoas com esse tipo de problema, a própria identidade torna-se vinculada ao trabalho. Até o lazer é visto como obrigação: a de tirar férias e viajar, jogar bola, ir a um restaurante. Torna-se então necessário aprender ou reaprender a lidar com o prazer. Faz-se necessário reequilibrar a forma de canalizar energia para o mundo.

*Daniele Vilela Cardoso Leite é Psicóloga, professora de Yôga e colunista do jornal Acontece (Caeté-MG) de 1999 a 2017, quando foi encerrada a circulação da edição impressa.

Comments (0)
Add Comment