Daniele Vilela Cardoso Leite*
Ao gerar uma criança os pais se expõe a vários riscos e ameaças. Desde as mais simples às mais complexas. Desde o fato de desejarem determinado gênero (menina ou menino) e poder vir diferente do esperado, até o fato de vir saudável ou não, com poucos ou nenhum desafio na área da saúde até o risco de sofrer algo mais complicado.
Estrutura-se tudo da melhor maneira possível para que nada dê errado e segue-se em frente. É preciso ter coragem. Essa estrutura também é desejada em termos de segurança pública. Mas, no entanto, a base sócio-econômica mundial caracteriza-se por profunda competitividade, com grandes desníveis que geram desigualdades, o que faz com que a violência cresça mais e mais.
Neste contexto ouve-se muitos indivíduos se perguntando o que fazer com esta realidade. Como lidar com a falta de segurança? Como criar filhos num mundo assim? Assaltos, assassinatos, estupros, guerras, o tráfico de drogas fazendo mais vítimas a cada instante…
No livro ?Encurtando a Adolescência, Tânia Zagury nos lembra alguns fatos significativos. Diz ela que ?…por pior que o mundo esteja, é bom lembrar que as coisas já foram piores do que hoje em dia?. ?Na Idade Média por exemplo, não havia lei que protegesse o cidadão comum, só havia a lei e o poder dos nobres. Na Antiguidade então, as coisas eram muito piores. Mesmo com tudo de horrível que ocorre hoje em dia, mal ou bem temos a quem recorrer- há lei e proteção (ainda que precária) para os cidadãos. Mas já pensou o que foi viver na época da escravidão? Ou em plena Inquisição? O homem já fez coisas bárbaras, terríveis. Pode até não parecer, mas se pensarmos de maneira global, mesmo que ainda falte muito para se chegar a uma sociedade de fato justa e digna, poderemos verificar que as coisas já evoluíram bastante.? Ao invés de ficar temendo o pior e apenas reclamando, alimentando sentimentos de impotência, ?… preparar o jovem para o mundo (e não ficar paralisado diante de um mundo violento) ? é a melhor contribuição que podemos dar a nossos filhos. Preparar nossos jovens para melhorar o que existe e não para se apoderar do melhor que existe. Diminuir a competitividade e o consumismo. Aumentar a tolerância e a capacidade de empatia. Trabalhar a solidariedade?.
Com essas palavras Tânia nos remete ao fato de que podemos reclamar e lamentar, fazer crítica e alimentar sentimentos de indignação, ou podemos ter a maturidade de ensinar valores éticos, baseados no respeito e não no egoísmo. Viver é correr riscos todo o tempo, e isso realmente deixa o ser humano inseguro, com tendência a sentir-se apenas vítima impotente diante da realidade. Mas viver é reagir aos desafios. Como diz Tânia, ?não podemos entregar os pontos?. Temos o que fazer sim. Acredite no potencial de seu filho. Estimule-o a respeitar o próximo e a si mesmo. Aceite que as diferenças existem e que temos que lidar com elas com respeito.
A vida é da ordem do imprevisível. Ao entender isso devemos inflar menos o nosso ego e saber que ao passar a perna, explorar o próximo, tentar sempre tirar vantagem em tudo é uma forma de alimentar as diferenças sociais e assim a violência. Percebe-se desta maneira como a sociedade é vítima dela mesma.
A questão espiritual também é muito importante em todo esse contexto, pois daí vem o sentido de todas essas reflexões e pensamentos. Nada acontece por acaso. Estamos neste mundo para evoluir. Orientar o filho do perigo acentuado de determinados locais, do risco de más companhias etc., é importante. Mas é mera ilusão que assim se tem o controle da situação. Portanto, façamos nossa parte ao invés de apenas reclamarmos e nos sentirmos vítimas, sendo que há sempre o que se pode fazer, desde que saiamos do ceticismo, do egoísmo, do comodismo.
*Daniele Vilela Cardoso Leite é Psicóloga, professora de Yôga e colunista do jornal Acontece (Caeté-MG) de 1999 a 2017, quando foi encerrada a circulação da edição impressa.