Daniele Vilela Cardoso Leite*
Aceitar as situações surgidas no decorrer da vida sem uma análise crítica faz com que muitas transformações necessárias e possíveis na história individual e coletiva não aconteçam.
Formas de pensar enraizadas e espalhadas determinam comportamentos, constroem a cultura e às vezes não possuem a mínima consistência, e são aceitas normalmente. É preciso desde as mínimas situações do dia-a-dia às mais complexas, fazer análise por vários ângulos, ver através de variadas possibilidades. É assim que a consciência se expande e eleva a percepção das coisas.
É preciso observar e analisar. As palavras dos outros não devem ser aceitas cegamente, por mais que possam parecer corretas. A imprensa por exemplo, é formadora de opinião, e possui um grande poder nas mãos para promover ou destruir pessoas, idéias, conceitos, e pode manipular muitas informações de acordo com o que for mais conveniente.
Sabemos que a mesma coisa, falada de modos diferentes, pode dar margem a interpretações e visões diferentes. Portanto a visão crítica é essencial para que não acreditemos indiscriminadamente em tudo que nos é falado. Mesmo aquelas fontes em que confiamos como família, amigos, instituições respeitadas. É claro que as referências vêm daí, mas até mesmo as boas referências podem e devem ser questionadas, em princípio, na consciência de cada um, pois não são perfeitas e sempre terão pontos de vista a serem melhorados.
A crítica aos mais variados setores, como por exemplo à sociedade, ao conhecimento, à cultura, traz crescimento e evolução. O trabalho científico possui essa característica crítica, e uma das ciências que estimulam explicitamente essa postura analítica é a filosofia. Ela faz pensar. Exige análise e abstração. É uma matéria importante no currículo escolar. A escola deve fazer o papel de despertar essa postura de vida. Mais que ensinar conceitos prontos e oferecer referências, é importante que ela ensine a refletir, a analisar. É preciso despertar a consciência crítica, fazer pensar. Isso traduz a famosa idéia de que “a escola deve formar, mais que informar”. Maléfico é quando a escola se torna apenas um centro de treinamento de habilidades.
Nosso ensino já avançou muito nesse sentido, mas ainda falta muito a alcançar. Lidar com a criticidade exige, por outro lado, sabedoria. A crítica pode se tornar apenas um canal de propagação do negativo caso não sirva como instrumento transformador. Não adianta focar no que estiver errado, mas sim na solução. Há pessoas que possuem habilidade de enxergar a necessidade de mudanças, mas que focam apenas nesse ponto e não vão além. Um exemplo básico, quantas vezes ouvimos o comentário “essa administração está horrível”, mas o autor da frase não contribui em nada para mudar a situação. Falar por falar, reclamar, não leva a nada. Ou melhor, leva ao reforço do negativo. Isso tanto na esfera micro quanto macro. Tanto no individual quanto no coletivo. A evolução, o crescimento, a transformação e a transcendência, vêm daí. É na fluidez do pensamento, da observação, da análise, da reflexão, que a produção de novas realidades vão tomando forma.
Enxergar apenas por um ângulo as situações vividas embota o crescimento. Temos que ajudar tanto na evolução do planeta como da nossa própria vida. Podemos ?nadar contra a maré?, com um modo de pensar rígido, e dessa maneira impedir a fluidez das mudanças, ou podemos ajudar na evolução dos fatos ao enxergar uma só situação por ângulos diferentes, com criticidade, reflexão, análise. Mas para isso é preciso observar. Quantas coisas passam despercebidas. A observação é preliminar à crítica.
Se cada um observar sua vida, suas atitudes e pensamentos a cada instante vivido, a amplitude de consciência se expande profundamente. Do equilíbrio entre a reflexão crítica e a prática, advém as grandes transformações. Que possamos ser partidários da evolução e não da paralisia. Que observemos, analisemos, para podermos evoluir, transformar, transcender.
*Daniele Vilela Cardoso Leite é Psicóloga, professora de Yôga e colunista do jornal Acontece (Caeté-MG) de 1999 a 2017, quando foi encerrada a circulação da edição impressa.