Daniele Vilela Cardoso Leite*
O Natal se aproxima e com ele reflexões das mais diversas. Puer e Senex são possíveis maneiras de estar no mundo, muito além da tradução ao pé da letra na qual puer seria jovem, adolescente, e senex uma palavra associada a senilidade, velhice.
Muito além de idade, o senex e o puer são uma questão de mentalidade. Nos surpreenderíamos com a grande quantidade de idosos pueris e adolescentes senis, no sentido em que o senex é da ordem do estabelecido, do previsível, do esperado, do rígido, do inflexível, e o puer do inesperado, do imprevisível, do inovador, do movimento, do fluir. No estado senex as energias se estagnam. É alcançado o ponto almejado e paralisa-se. Não vai além. É a certeza da completude, do preenchimento. São as pessoas que não aceitam sua condição de filhos de Deus mas se acham o próprio Deus.
Pessoas da ordem do senex não realizam suas missões. Missões enquanto potencialidades pessoais, chamados de alma. São reprimidas, bloqueadas, não têm a coragem, não podem ou não sabem escutar o chamado, a vocação, a missão de vida. O senex passa pelo medo do novo. O que diz ?eu sei e não preciso mais aprender? à imagem do arquétipo do senex. O arquétipo do puer é da ordem do transcendente, do transformador. É livre, dinâmico.
Enquanto o senex é da ordem do estabelecido e do oficial, o puer emerge como uma quebra de expectativas. Mas o puer em excesso assim como o senex em excesso, só trazem grande prejuízo no sentido em que o senex excessivo traz o patológico, a depressão, o pessimismo, a dureza de coração, e o puer exagerado não sabe esperar, é inconsequente, imaturo, ilimitado. O puer é da ordem da coragem, e o senex do medo.
Ambos em exagero provocam a morte, o fim. Mas em equilíbrio e harmonia se completam e formam um só arquétipo. Ambos têm o seu valor, sua necessidade, seu papel. Mas um completando o outro, e não unilaterais. A unilateralidade do puer induz a uma inconsequência, a uma desconexão. A unilateralidade do senex também leva à loucura, pois quando se depara com perguntas que não têm respostas, especialmente as existenciais, entra em desespero pois se percebe de frente com a verdade negada de que não é o momento certo de paralisar (não existe esse momento). De que existe um caminho extenso até a completude (atrás da luz ainda há luz). De que somos seres inacabados, e por isso não podemos paralisar neste estágio.
Não temos todas as respostas. É necessário, para se viver com leveza e sabedoria, a integração do puer e do senex. Pois isso faz com que os indivíduos se reconheçam como seres com potenciais inatos, prontos a criarem, desenvolverem, acharem novos caminhos, contanto que aceitem suas perguntas sem respostas. Tem que haver fé para integrá-los, pois implica em estar constantemente em movimento, buscando respostas, acreditando que no momento e na hora certa essas respostas surgirão, e paralelamente aceitando quando elas não forem encontradas.
O Natal enquanto união e equilíbrio do puer e do senex surge do nascimento de um ser humano e divino, o Menino Jesus, que nos lembra, remete e informa sobre a nossa condição de pessoas que são, também, humanas e divinas. Que carregam dentro de si, independente da idade, forças puer e senex e que precisam exercitar a medida de cada uma, para que, durante o exercício de buscar esse equilíbrio, possamos aprender e vivenciar os valores deixados pelo Jesus menino e homem, de fé, humildade, amor, solidariedade, integração, transcendência. Essa é, até o ponto em que podemos perceber, uma possível didática da Divindade…
OBS. Leitura Recomendada: Hillman, J. – O Livro do Puer – Editora Paulus.
*Daniele Vilela Cardoso Leite é Psicóloga, professora de Yôga e colunista do jornal Acontece (Caeté-MG) de 1999 a 2017, quando foi encerrada a circulação da edição impressa.