Daniele Vilela Cardoso Leite*
Assistir à televisão e obter conhecimentos através dos meios de comunicação sem visão crítica é permitir que grande manipulação de idéias, valores e pensamentos aconteçam.
Mesmo emissoras consagradas, jornais de renome, revistas respeitadas devem ser constantemente questionados pelos que leem ou assistem.
Há algumas semanas o Programa dominical da Rede Globo, “Fantástico”, explorou o tema das drogas e mostrou um jovem usuário da maconha. Mostrou a desestrutura do adolescente, revoltado, irresponsável, inconsequente, imaturo, que não valorizava a família e os valores advindos de uma consciência adequada em relação à vida.
A Psicanalista Regina Teixeira da Costa, escritora semanal do Jornal “Estado de Minas” escreveu no domingo, dia 20 de julho, uma acirrada crítica ao modo como que a questão foi abordada. Segundo ela, “…A reportagem mostra um jovem descontrolado, agressivo, mal educadíssimo e os últimos recursos da mãe, da qual poderíamos dizer a mesma coisa. Numa covardia extrema, em vez de conversar com o rapaz, ela toma medidas radicais que dão espaço para que ele a desafie. A mãe demonstra temer qualquer contato direto em que deva se colocar como autoridade respeitável diante do filho, preferindo as ameaças que invocam a polícia, as correntes, a expulsão. Vê-se que ele não recua diante das chantagens emocionais ou das ameaças explícitas. Ali não há autoridade nem nunca deve ter havido. E nenhum respeito, seja próprio, seja pelo outro. A adolescência é um momento em que atravessamos uma crise. É a crise do despertar. Deve-se nesse período da vida aprender a conviver socialmente, apropriando-se daquilo que é um ser adulto. São reposicionamentos a fazer. Passar da infância ao mundo adulto no qual se deve ser responsável pelas próprias opiniões, pela imagem social, pelos relacionamentos fora da família, assumir em nome próprio o desejo. Isso implica em um doloroso afastamento dos pais, nem sempre cientes de que a dificuldade deles é também dos filhos…”
“…O Fantástico lança a suspeita de que é a maconha uma das causas da crise, e de fato ela tem ali uma função para o rapaz. Mas não essa que apontam. Não quero fazer apologia do uso da maconha, nem dizer que seu uso não causa prejuízos, mas nem todos os usuários agem assim…” “… Na adolescência é frequente o desencadeamento de crises graves, que merecem uma escuta delicada e respeitosa por ser um momento de sair da alienação nos desejos dos pais, isto é, hora de largar a barra de saia e se bancar. De qualquer modo, o tratamento deveria ser outro. Embora estejamos no mundo global e boçal em que alguns querem seus minutos de fama e pareça desejável a exposição da vida privada, é um absurdo colocar esse rapaz nessa situação para ser estigmatizado e além disso, colocar problemas sérios como esse de maneira superficial e preconceituosa.”
A Psicanalista Regina não está defendendo, claro, o uso da maconha. Está defendendo, sim, que a interpretação dada pelo programa à situação em questão foi inadequada, superficial. Programas sensacionalistas, que procuram audiência, não primam pela sutileza e peculiaridade de cada caso e geralmente desrespeitam a inteligência dos que assistem apelando para o que vai gerar mais comentários.
Crianças, adolescentes, indivíduos variados têm sido expostos na televisão para a interpretação dos telespectadores e interpretação também de alguns que se dizem especialistas (terapeutas, etc.) de forma desrespeitosa, mostrando o que as pessoas têm de pior, com receitinhas prontas para solucionar as questões. As pessoas e situações são singulares, particulares, e não existem receitas prontas para se criar filhos. Quem assistir ao programa (por exemplo o programa da Nani) buscando uma receita vai estar cometendo um equívoco). Cada situação é única. Fato é que os meios de comunicação exploram o que querem e da maneira que desejam, e o filtro a isso tudo cabe a cada um, com sua capacidade para discernir o que pode ser proveitoso do que não seja bom. Por isso estudar sempre e colocar um olhar crítico a tudo que é ofertado é essencial, primordial…
*Daniele Vilela Cardoso Leite é Psicóloga, professora de Yôga e colunista do jornal Acontece (Caeté-MG) de 1999 a 2017, quando foi encerrada a circulação da edição impressa.